
Reparei que na minha caixa de correio só recebo contas, publicidade, contas e mais contas! Cartas dos amigos, aquele envelope onde aparece a nossa morada e de quem nos enviou, aquele aroma amarfanhado, maltratado e com um selo... isso deixou de existir! Só recebo cartas que começam por V.Exa (não era preciso ofender um gajo!), sempre com um prazo (a nível do espaço temporal) como se de uma sentença de morte se tratasse! Onde está a caligrafia? Onde está a palavra rasurada? Onde está um pouco de humanismo?
A carta, o envelope foram substituídos pela @, pelo usuário e a sua senha de identificação... o primeiro morto já se tornou cadáver! Rei Morto, Rei Posto e Viva ao Rei!
Cada vez que mando um e-mail, recordo-me perfeitamente das feições a quem o mando, mas a minha lista de endereços parece mais uma daquelas obras fabulosas de Hollywood com 20.000 figurantes! Como é bonito vermos o nosso e-mail (link, página ou porra alguma) a dizer-nos “
A Sua Mensagem Foi Enviada Com Sucesso” e num sinal de aprovação agradecemos a um monitor (podia ser a um carteiro... mas não, é a um monitor)!
Já não consigo passar sem ele... já não consigo passar sem um CPU, um teclado, um monitor, um rato e uma floresta de fios, que até o palácio de Versalhes se torna demasiado pequeno!
Reparem que todos os dias me prostituo intelectualmente por um punhado de cobres (pô... até dá vontade de chorar cada vez que olho para o meu recibo) e ainda por cima, com a ajuda dessa máquina... sempre a dar palpites!
A nossa linguagem ou maneira de falar já começou a mudar. São as palavras estrangeiras, a invenção de novos verbos e a falta de imaginação para a tradução dos termos técnicos.
Será que as nossas conversas vão passar pela compra de 2 Gigas de carne alentejana, a vacina panda para gripe, o tamanho não importa mas convém que tenha mais de 20Kbytes, aquele sofria dos olhos e deram-lhe uma placa gráfica e o puto que se preparava para os exames da universidade e a mãe deu-lhe umas ampolas com RAM! Ufa!
E o MSN? Esse milagre da nova tecnologia! Gostamos de ter uma fotografia pomposa, tirada do nosso casamento, onde a nossa sogra nos dá um enorme beijo de felicidade mas com um “facalhão” pronto a ser espetado nas nossas costas! E as conversas? Esse paradigma... tem algo de sensual, de proximidade e de intelectualidade! Lindo! Lindo!
- Olha donde teclas (isto é algum verbo que aparece no dicionário?)...
- Como te chamas? O teu nick (alcunha em português e muitos gajos neste planeta) já eu sei! Quero é saber o teu nome verdadeiro?
- Manda-me uma foto tua! (entretanto do outro lado da linha alguém responde telepaticamente)
– O que tu queres sei eu...
Pessoas que praticam este horrendo monólogo com um monitor... é obvio que chegam aos 35 anos e acham que o manicómio é um lugar acolhedor!
É esta a paixão pelo desconhecido para conhecer que o tempo nos urge lá fora? Deve ser...
E blogs? Já falei de blogs? Desses milhões caixotes de lixo que andam pela Internet espalhados... Blogs? Argh.... Esses postites (aqueles papeis amarelos com cola, que ora cola, ora descola, que utilizamos para embelezar o monitor) da Internet... Aí meu deus, o que eu criei!
Peço desculpa, não posso continuar a escrever assim. Por cada visitante recebo 1 cêntimo (livre de impostos) e isso ajuda-me um bocado a não ter que olhar de frente para o preço da Gasolina!
Sobre tudo o que escrevi... o que há-de vir mais?
(Texto de RTente (Tentini) - Maio de 2006)